Nacionalidades


Posso  estar errado – não verifiquei – mas neste ano haverá o maior número de concorrentes brasileiros em Le Mans, uns oito ou nove pilotos, se contarmos o Gustavo Menezes que corre como americano. Infelizmente, nenhum tem reais chances de vencer na geral, pois nenhum brazuca corre na Toyota ou Porsche, porém na LMP2 estamos bem representados. Enquanto isso, na F-1 contamos somente com Massa, não vejo grandes chances de Nasr voltar, e na Fórmula 2 Sette Camara está longe de mostrar serviço. Na Indycar simplesmente não há renovação brasileira há anos – a grande esperança é Matheus Leist, que corre na Indy Lights.

Será que os brasileiros não sabem mais pilotar? Longe disso, o assunto é complexo e já discuti várias vezes. Além da mudança de paradigma de ascensão de pilotos à F-1 existe a questão de maior concorrência em termos de nacionalidades nas outras categorias.

Em 1969, um ano antes de Emerson chegar na F-1, a categoria ainda era dominada por pilotos “anglos”. Nas equipes permanentes da categoria maior, nada menos do que 10 pilotos eram de fala inglesa, ao passo que somente cinco falavam outros idiomas. O pool de pilotos que chegava à F-1 nos anos 60 claramente favorecia os britânicos, neo-zelandeses, australianos, sul-africanos, americanos e irlandeses. Já em 1970, houve uma mudança de paradigma. 15 pilotos de equipes permanentes (alguns participaram somente de poucas corridas) falavam inglês, ao passo que 15 falavam outros idiomas (alguns, como Reine Wisell, também participaram de poucas provas). Entre os idiomas estava o português, representado por Emerson. Passava a haver maior diversidade do pool de pilotos, algo que permanece até hoje.

Naquela época, chegavam no topo do automobilismo pilotos de umas 18 nacionalidades diferentes, no máximo. Geralmente eram europeus ocidentais, com alguns pilotos das Américas, Oceania e África do Sul para engrossar o caldo.

Tive o cuidado de analisar a seção de resultados do anuário Autocourse de 1976 e uma edição mais recente, de 2014, quase 40 anos depois. Sei que não é uma análise cem por cento rigorosa, pois essa seção de resultados basicamente cobria a F-1 e F-2 completas, e somente os dez primeiros de outras categorias. Em 1976, esta seção incluía pilotos de 26 países: Grã-Bretanha, Argentina, Brasil, Itália, França, Irlanda, Alemanha, Liechtenstein, Áustria, Nova Zelândia, Austrália, Holanda, Bélgica, Finlândia, Estados Unidos, Venezuela, Canadá, México, Suécia, Suiça, Espanha, África do Sul, Andorra, Dinamarca, Japão e Antígua. Sei que de passagem pilotos de algumas outras nacionalidades participaram de corridas internacionais de primeira linha naquele ano: portugueses pelo menos na corrida de subida de montanha em Estrela, tchecos na corrida de Brno no Europeu de Turismo, colombianos e dominicanos nas 24 horas de Daytona, quem sabe algum iugoslavo no Europeu de Turismo. Porém, dá uma ideia razoavelmente precisa do que era o “mercado” na época.

Já em 2014, a mesma seção de resultados inclui pilotos de nada menos do que 48 nacionalidades: Grã-Bretanha, França, Brasil, Argentina, Malásia, Hungria, Noruega, Emirados Árabes Unidos, China, Rússia, Holanda, Bélgica, Dinamarca, Itália, Finlândia, Áustria, Alemanha, Nova Zelândia, Austrália, Colômbia, Angola, México, África do Sul, Canadá, Uruguai, Espanha, Portugal, Mônaco, Romênia, Suiça,Irlanda, Japão, Índia, Macau, Estados Unidos, Venezuela, Indonésia, Chipre, Sérvia, Marrocos, Israel, Tailândia, República Tcheca, Ucrânia, Filipinas, Belarússia, Estônia e Arábia Saudita. Por cima, imagino que pilotos de pelos menos umas dez outras nacionalidades possam ter participado de corridas internacionais cobertas nessa seção (como Bulgária, Polônia, Turquia, mini-países europeus, países do Balcãs, Grécia, ex repúblicas soviéticas) , mas não terminaram entre os dez primeiros colocados, nem participaram em Le Mans, Indycar ou GP2 (cujos resultados são completamente divulgados).

Nota-se aqui que o pool realmente é bastante mais extenso. Pilotos da Ásia eram praticamente inexistentes no automobilismo internacional em 1976, salvo por japoneses, hoje  diversos países são representados: Japão, China, Tailândia, Filipinas, Malásia, Índia, Indonésia. Pilotos do Oriente Médio estavam completamente ausentes e a Europa Oriental  geralmente era representada somente pelos tchecos.


Ou seja, há muita gente competindo por um lugar ao sol, e trazendo dinheiro para o esporte, frequentemente verba pública, principalmente dos países mais pobres. Ao passo que o Brasil encontrou uma brecha no mercado restrito com o Emerson em 1970, e por lá ficou, hoje, o piloto brasileiro tem que concorrer com pilotos de mercados não tradicionais como Tailândia, Israel e Romênia. Assim, realmente a tendência é uma participação menor nas categorias top como Fórmula 1, Fórmula 2, Indycar e LMP1, e uma maior penetração em LMP2, GTs, etc. É uma simples aplicação da lei da oferta e procura. Não tem como escapar.  

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